29 de mar. de 2006

Alerta aos funcionários

O ‘Fórum da Quinta do Conde’ é, assumidamente, julgo eu, um jornal partidário. A acção do jornal e o facto de o seu director, Victor Antunes, até ter constado nas listas da CDU nas últimas autárquicas não deixam grandes margens para dúvidas em relação à sua linha editorial. Se houvesse um partidarismo encapotado seria mais grave. Assim, quem abre o jornal já sabe com o que pode contar.
O editorial do último ‘Fórum da Quinta do Conde’ não deixa, no entanto, de ser sintomático e revelador de alguns tiques que se vêm revelando na gestão comunista da autarquia. Neste texto, intitulado ‘Seis Meses!’, Vítor Antunes tece rasgados elogios ao primeiro semestre da gestão de Augusto Pólvora, enaltecendo, sobretudo, a atenção que o edil presta aos problemas da Quinta do Conde. Nesse contexto, o director do jornal aproveita para salientar a atitude positiva de “muitos” funcionários da autarquia. O pior, são os “outros”, os que, apesar de poucos, «conseguem, mesmo assim, minar sabotar, bloquear, boicotar, sobretudo quando têm alavancas importantes nas suas mãos». E acrescenta, prudente, Victor Antunes: «Exageros nossos? O tempo já fala, e gritará no futuro, caso não sejam tomadas as devidas medidas!».
Ora bem, com este tipo de discurso, qualquer funcionário da autarquia, mesmo o que se considera competente e servidor da população, sentirá sobre a sua cabeça as espadas do despedimento, da prateleira, ou qualquer outra. Se, de facto, existirem “sabotadores” da até aqui “brilhante” acção de Augusto Pólvora, esses, enfiarão a carapuça. Os restantes, enfiam por simpatia porque, no ar, há suspeição e desconfiança. O jornal assume-o publicamente.
Claro que, o director do jornal trata também de ilibar Augusto Pólvora desse papel de inspector, defendendo que o edil, benevolente, está a dar, aos “sabotadores” o “benefício da dúvida”.
Mas não se pense que esse favor vai durar muito mais, porque, como escreve Victor Antunes: «Como não nos parece que Augusto Pólvora “se deixe levar” por uma qualquer festa de aniversário, acreditamos no futuro».
O aviso parece ter destinatários muito específicos, mas, já agora, fica no ar a suspeição, porque dá sempre jeito, não vá algum funcionário da autarquia dar em dissidente. É preciso que eles tenham medo… Muito medo… E que saibam que estão atentos ao seu trabalho.

28 de mar. de 2006

Saúde e Mentiras

Mais de 10.000 pessoas participaram, este fim-de-semana, num cordão humano, que alcançou a extensão de 4 quilómetros, ligando a baía do Seixal. No local estiveram, a dar a cara, os presidentes das autarquias do Seixal, Almada e… Sesimbra. Augusto Pólvora “deu as mãos” reivindicando um novo hospital no concelho do Seixal. Será impressão minha, ou eu nunca vi o presidente da Câmara Municipal de Sesimbra a empenhar-se tanto, ou pelo menos de forma tão visível, na reivindicação pela manutenção do SAP de Sesimbra ou pelo novo centro de saúde da Quinta do Conde? Até porque, se nascer um novo hospital do Seixal, é bastante provável que as reivindicações da população do concelho de Sesimbra caiam em saco roto. Enquanto isso, continua a haver noites em que o hospital de Sesimbra não tem médico e continuarão a correr rumores (até um dia, infelizmente, se concretizarem) de que deixará de haver um serviço de atendimento permanente.
Obviamente, não me choca que Augusto Pólvora participe nestas iniciativas que dão direito à presença em todos os telejornais. Mas era bom que se desse visibilidade, ou pelo menos se aproveitasse estas oportunidades, para falar dos “problemazinhos” do concelho.

Fiquei a saber, através de um outro blogue, que a Câmara Municipal de Sesimbra decidiu lançar um concurso inovador e completamente estapafúrdio: o concurso do Dia das Mentiras. Serão premiadas as mentiras mais criativas idealizadas pelos jovens do concelho, estudantes do 3.º ciclo e secundário. Por este (arrepiante) andar, se quem idealizou esta ideia vivesse em pleno Afeganistão, poderia muito bem lançar um concurso na escola primária para ver quem seria capaz de fazer uma bomba “bestial”, usando a criatividade. No Brasil, por exemplo, lançaria o concurso do melhor arrastão de praia. Mas enfim, em Sesimbra, ficamos pela mentira.

27 de mar. de 2006

PDM descartável

A Câmara Municipal de Sesimbra, na primeira sessão pública sobre o Plano de Pormenor da Mata de Sesimbra distribuiu uma brochura muito verde – verde claro, verde escuro, verde seco e… por que não, o “verde futuro”, slogan do Banco Espírito Santo – para dar a conhecer o resumo não técnico do Estudo Ambiental do Plano de Pormenor.
Neste documento são feitas algumas apreciações sobre o Plano Director Municipal (PDM) de Sesimbra. Ora, segundo a brochura, este instrumento de ordenamento do território permite que «os actuais proprietários de cada terreno (com mais de 100 ha) possam construir um empreendimento, com um índice de 0,02. [Como tal,] No limite, se dividirmos os 3.700 ha da Mata de Sesimbra por 100, chegaremos ao número de 37 empreendimentos e respectivos campos de golfe possíveis de serem construídos nesta zona do concelho». Mais à frente, diz ainda o mesmo documento: «Apesar do referido no PDM, todas as explorações existentes na zona da Mata de Sesimbra ultrapassam actualmente as áreas de exploração licenciadas». Sobre as acessibilidade, a brochura concebida pela autarquia conclui também que «os desenvolvimentos urbanos previstos no actual PDM são por si só geradores de volumes de tráfego, encontrando-se completamente desadequados à rede de transporte disponível». Já no que diz respeito às infra-estruturas urbanas é escrito que, «a aplicação do PDM de Sesimbra permitirá, tal como mencionado anteriormente, a edificação de diversos empreendimentos dispersos e respectivos campos de golfe na área do Plano de Pormenor da Mata de Sesimbra. Por forma a garantir o seu funcionamento verificar-se-á a necessidade de construir inúmeras infra-estruturas (…). [Assim, o] número de unidades de alojamento e a sua área de ocupação, a quantidade de infra-estruturas urbanas a construir será sempre superior no caso de construção de inúmeros loteamentos dispersos (…)».
Com tanto aspecto negativo, apetece perguntar se afinal estamos todos seguros com o PDM que temos, não vá algum dia cair-nos um prédio de betão em cima. Não deixa, no entanto, de ser interessante notar que o PDM de Sesimbra nasceu ainda no reinado CDU. A mesma CDU que, agora volta ao poder, e conclui que afinal esse documento já não serve Sesimbra. O que será que mudou de 1998 para cá? O que é certo é que, nessa altura, a Mata já existia, tal como hoje. Esta atitude política, no entanto, deixa dúvidas. Muitas dúvidas sobre o “verde futuro” que querem plantar naquela zona verde.
Já agora… Alguém me sabe informar sobre quem é a “Ferro e Pimenta S.A.”?

24 de mar. de 2006

Propaganda na Quinta do Conde

Hoje terá lugar a primeira sessão pública para discussão do Plano de Pormenor da Zona Sul da Mata de Sesimbra. Ou, melhor dizendo, hoje terá lugar a primeira sessão de propaganda ao mega-empreendimento turístico previsto para a Mata de Sesimbra. O debate terá lugar às 21.30 horas, na Escola Básica n.º 3 do Conde I, na freguesia da Quinta do Conde.
Estou deveras curios@ para ver como os promotores e a Câmara Municipal de Sesimbra vão impingir à população um projecto completamente megalómano, descabido, inconsistente, inconsequente, injustificável, inqualificável e mais uns quantos in-qualquer-coisa, como se estivessem prestes a criar um paraíso na terra.
Sob a capa de projecto turístico hiper-ambiental esconde-se, na realidade, um enorme projecto de urbanização, para o qual está prevista a criação de 8470 unidades de alojamento, que podem ser quartos ou apartamentos, mas que multiplicado por 4 ou 5, tendo em conta a ocupação média de cada uma, resulta numa população de 40 a 50 mil ocupantes. Criar no meio desta brutalidade um campo de golfe ou uma ciclovia só para dizer que tudo isto é ambientalmente sustentável, tendo em conta a pressão humana e de infra-estruturas que isto criará, não me parece justificável.
Como se não bastasse, persistem as falcatruas das transferências de índices de capacidade construtiva.
Além disso, este projecto que querem construir, numa extensa zona verde, vai fazer fronteira com áreas sensíveis como o Parque Natural da Arrábida ou a Lagoa de Albufeira. Não deixa de ser estranho que, por um lado, se tente acabar com a pesca porque tem consequências ambientais no PNA, mas, por outro, deixem crescer nos seus limites um empreendimento que ameaça mudar, irremediavelmente, este concelho. Se um pescador incomoda muita gente, 50 mil pessoas incomodarão, supostamente, muito mais.
Claro que existem argumentos de peso na defesa do projecto Mata de Sesimbra. Os empregos que criará, o fim da pedreiras e mais algumas promessas que soam bem a muita gente. Este, afinal, é um projecto com muitas vantagens! Até parece que, ao criarem lá dentro uma cidade, os potenciais turistas terão sequer necessidade de sair daquele resort de luxo para fazer despesa no comércio tradicional, quando lá terão bons restaurantes e outros apoios. Depois, há sempre um Lidl, um Plus, um Pingo Doce e outros que tais, bem mais à mão do que a mercearia da esquina. E até parece que as pedreiras e areeiros não têm já legislação que as regule, bastando que ela fosse cumprida.
A propósito de um post anterior, alguns comentários salientaram o facto de que, o que está em discussão é apenas o plano de pormenor da zona sul da Mata. De facto, seria importante poder avaliar, de forma integrada, o da zona norte, onde vai surgir o empreendimento da Herdade da Apostiça. Não faz qualquer sentido analisar os dois projectos de forma desarticulada. Mas, neste caso, como em tantos outros, temos de comer aquilo que nos dão, da forma como nos dão. E o que não é o que mais lhes convém. Mas só o digere quem quer.
Enfim, nada como ouvir a acção de propaganda agendada para esta noite para perceber o que nos querem vender e a forma como doiram a pílula. Até estou, de certa forma, curios@.
A ver vamos.

21 de mar. de 2006

Dia Mundial da Poesia

Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca,
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.

Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto,
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.

De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas, inesperadas
Como a poesia ou o amor.

(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído,
No papel abandonado)

Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.

Alexandre O'Neill

Espelho meu, alguém tem um umbigo maior que o meu?

O texto que abaixo reproduzo foi retirado do ‘Jornal de Sesimbra’ de Fevereiro. Trata-se de um excerto dum artigo de opinião assinado por Joel Hasse Ferreira, professor universitário, membro da bancada do PS da Assembleia Municipal de Sesimbra e deputado europeu (uff! Tanta coisa!). Apenas o sublinhado é da minha autoria.

«Há dias muito interessantes no Parlamento Europeu, quer em Bruxelas, quer em Estrasburgo. Em poucos dias, votou-se em Plenário o novo texto da Directiva de Serviços, ouvimos António Guterres na Comissão do Desenvolvimento do Parlamento Europeu e António Costa no Clube Benelux. A RTP emitiu um debate sobre a Directiva de Serviços e a SIC gravou o primeiro debate de um novo modelo de programa SIC Europa, ambos com a minha participação. A TSF transmitiu rigorosamente uma declaração/entrevista minha sobre a Directiva de Serviços e a SIC transmitiu também uma entrevista comigo, sobre o mesmo assunto – imediatamente no final do Plenário que aprovou o novo texto da Directiva. O Diário Económico publicou um bom ‘dossier’ sobre a mesma Directiva de Serviços, incluindo um artigo da minha autoria. Um significativo conjunto de sindicalistas e outro de jornalistas foram recebidos por Edite Estrela e por mim próprio, com alguns deputados de outros partidos, em Estrasburgo. Tudo isto em poucos dias fatigantes, mas muito estimulantes. Também foi votado, entretanto, em Comissão de Emprego e Assuntos Sociais, o relatório sobre Demografia e Solidariedade entre Gerações, sobre o qual tinha promovido com Edite Estrela, uma audição Pública em Portugal e do qual fui o relator e negociador socialista nesta mesma Comissão do Emprego.»

Uff! Que dias estafantes. Será que Hasse Ferreira tem tido tempo para fazer outras coisas como, sei lá… Olhar para o umbigo?!

20 de mar. de 2006

Ideias

Estou habituad@. Tod@s estam@s habituad@s a que, de um dia para o outro alguém decida virar ao contrário o sentido do trânsito. O que eu não esperava encontrar, era um corte súbito da circulação ao virar duma esquina. Subia eu a Quintinha, em direcção à Cotovia, quando, atrás duma curva, dou de caras com um conjunto de baias que me impediram de continuar a marcha. Era noite escura, chovia, e só por sorte não levei aquele aparato à frente do carro. No momento, larguei uns quantos lagartos e cobras, como se compreende, mas nada mais pude fazer, senão dar a volta, contornar o triângulo e seguir a minha marcha. Agora, ando sempre ‘à coca’ não vá deparar-me com mais uma destas ideias brilhantes.
Por falar em ideias brilhantes… parece que durante os próximos dias vamos andar a discutir mais uma ideia brilhante chamada ‘Mata de Sesimbra’. Tão brilhante, tão brilhante, toda adamada a diamantes e pérolas, com um banho de ouro tipo WWF de vários quilates em cima, que ofuscam olhares sensatos e críticos sobre um projecto de origem duvidosa. E esta ideia brilhante, infelizmente, não se contorna tão facilmente como o corte de trânsito da noite passada. Mas há quem o queira discutir e o apresente com a mesma leviandade como se falasse em apenas mais uma alteração ao trânsito.

15 de mar. de 2006

Semelhanças

Todos os que, habitualmente, navegamos no imenso mundo que é internet, sabemos que há sempre possibilidade de sermos surpreendidos. Certo dia, digitei um endereço de um site onde é possível aceder a jornais de qualquer país do mundo que possuem edição on-line . É o www.thepaperboy.com. Uma pequena falha numa única e insignificante letra conduziu-me, de imediato, a um outro espaço desta imensa rede de onde saltavam imensos boys mas nenhum trazia o paper que procurava. Acontece...
Hoje, aconteceu um episódio semelhante. Desta feita o problema não teve a ver com uma letra, mas sim com a ausência de três: www. Ora vejam se descobrem as diferenças:
Este é o site onde a Câmara Municipal de Sesimbra disponibiliza o Plano de Pormenor da Zona Sul da Mata de Sesimbra.
Este, é um site promocional do projecto, da responsabilidade do promotor Pelicano.
Convém, aos mais desatentos, atentar a estes pequenos, grandes, pormenores.

14 de mar. de 2006

Discussão Pública

Como já seria de esperar, depois de surgirem na imprensa diversas notícias sobre as (-sistematicamente reiteradas- boas) intenções da WWF, lá surge a explicação... Já está em discussão o Plano de Pormenor da Mata de Sesimbra. Alguns dos documentos disponíveis on-line, nomeadamente, no que diz respeito à alínea F, não abrem. Quem quiser ver o documento todo terá mesmo de se deslocar aos locais indicados pela autarquia onde disponibilizam uma cópia em papel.
As sessões públicas realizar-se-ão durante as próximas semanas, nas três freguesias:
24 de Março, 21.30h
Escola Básica nº 3 do Conde I
Freguesia da Quinta do Conde

7 de Abril, 21.30h
Centro Paroquial do Castelo, Corredoura
Freguesia do Castelo

21 de Abril, 21.30h
Auditório Conde de Ferreira
Freguesia de Santiago

8 de mar. de 2006

A Mulher por Vinicius de Moraes

Receita de mulher

As muito feias que me perdoem
Mas beleza é fundamental. É preciso
Que haja qualquer coisa de flor em tudo isso
Qualquer coisa de dança,
qualquer coisa de haute couture
Em tudo isso (ou então
Que a mulher se socialize
elegantemente em azul,
como na República Popular Chinesa).
Não há meio-termo possível. É preciso
Que tudo isso seja belo. É preciso
que súbito tenha-se a
impressão de ver uma
garça apenas pousada e que um rosto
Adquira de vez em quando essa cor só
encontrável no terceiro minuto da aurora.
É preciso que tudo isso seja sem ser, mas
que se reflita e desabroche
No olhar dos homens. É preciso,
é absolutamente preciso
Que seja tudo belo e inesperado. É preciso que
umas pálpebras cerradas
Lembrem um verso de Éluard e que se acaricie nuns braços
Alguma coisa além da carne: que se os toque
Como no âmbar de uma tarde. Ah, deixai-me dizer-vos
Que é preciso que a mulher que ali está como a corola ante o pássaro
Seja bela ou tenha pelo menos um rosto que lembre um templo e
Seja leve como um resto de nuvem: mas que seja uma nuvem
Com olhos e nádegas. Nádegas é importantíssimo. Olhos então
Nem se fala, que olhe com certa maldade inocente. Uma boca
Fresca (nunca úmida!) é também de extrema pertinência.
É preciso que as extremidades sejam magras; que uns ossos
Despontem, sobretudo a rótula no cruzar das pernas,
e as pontas pélvicas
No enlaçar de uma cintura semovente.
Gravíssimo é porém o problema das saboneteiras:
uma mulher sem saboneteiras
É como um rio sem pontes. Indispensável.
Que haja uma hipótese de barriguinha, e em seguida
A mulher se alteie em cálice, e que seus seios
Sejam uma expressão greco-romana, mas que gótica ou barroca
E possam iluminar o escuro com uma capacidade mínima de cinco velas.
Sobremodo pertinaz é estarem a caveira e a coluna vertebral
Levemente à mostra; e que exista um grande latifúndio dorsal!
Os membros que terminem como hastes, mas que haja um certo volume de coxas
E que elas sejam lisas, lisas como a pétala e cobertas de suavíssima penugem
No entanto, sensível à carícia em sentido contrário.
É aconselhável na axila uma doce relva com aroma próprio
Apenas sensível (um mínimo de produtos farmacêuticos!).
Preferíveis sem dúvida os pescoços longos
De forma que a cabeça dê por vezes a impressão
De nada ter a ver com o corpo, e a mulher não lembre
Flores sem mistério. Pés e mãos devem conter elementos góticos
Discretos. A pele deve ser frescas nas mãos, nos braços, no dorso, e na face
Mas que as concavidades e reentrâncias tenham uma temperatura nunca inferior
A 37 graus centígrados, podendo eventualmente provocar queimaduras
Do primeiro grau. Os olhos, que sejam de preferência grandes
E de rotação pelo menos tão lenta quanto a da Terra; e
Que se coloquem sempre para lá de um invisível muro de paixão
Que é preciso ultrapassar. Que a mulher seja em princípio alta
Ou, caso baixa, que tenha a atitude mental dos altos píncaros.
Ah, que a mulher dê sempre a impressão de que se fechar os olhos
Ao abri-los ela não estará mais presente
Com seu sorriso e suas tramas. Que ela surja, não venha; parta, não vá
E que possua uma certa capacidade de emudecer subitamente e nos fazer beber
O fel da dúvida. Oh, sobretudo
Que ela não perca nunca, não importa em que mundo
Não importa em que circunstâncias, a sua infinita volubilidade
De pássaro; e que acariciada no fundo de si mesma
Transforme-se em fera sem perder sua graça de ave; e que exale sempre
O impossível perfume; e destile sempre
O embriagante mel; e cante sempre o inaudível canto
Da sua combustão; e não deixe de ser nunca a eterna dançarina
Do efêmero; e em sua incalculável imperfeição
Constitua a coisa mais bela e mais perfeita de toda a criação inumerável.

Vinicius de Moraes

3 de mar. de 2006

Porque mexe a Mata?

Nos últimos dias, surgiram diversas notícias na imprensa, de que um responsável norte-americano da WWF estaria em Portugal para estudar o projecto do mega-empreendimento turístico previsto para a Mata de Sesimbra. Sim, para a Mata de Sesimbra! Não tenhamos dúvidas do local. Sim, é aquele mesmo que tem pinheiros a apodrecer... e tal e coiso.
Ontem, a WWF voltou à carga para anunciar que está a elaborar projectos de requalificação urbana sustentável para a Quinta do Conde. Diz esta recente notícia, publicada no Público On-line, o seguinte:
«"A Câmara de Sesimbra está a desenvolver um plano de urbanização para esse local e concordou que a WWF participe, elaborando projectos para corredores ecológicos ou para a adaptação das casas a uma melhor eficiência energética e uso da água", afirmou hoje em conferência de imprensa Eduardo Gonçalves, o representante da WWF em Portugal.»
Como se não bastasse, o mesmo responsável adiantou:
"Estamos até a estudar a hipótese de certificar a pesca em Sesimbra".
Agora não falamos da Mata de Sesimbra! Sim, não tenhamos dúvidas. Nada de confusões! Aqui é Quinta do Conde e vila de Sesimbra! Alto lá!
Uma coisa é uma coisa, outra coisa, é outra coisa.
Mas, sabem que mais... eu não acredito em coincidências. É defeito, não é feitio. Além disso, sou pobre. Com tão grande esmola tenho o direito de duvidar.
Já agora, quando é que vai mesmo ser debatido o plano de pormenor para a Mata?
Pois é... Desculpem a presunção mas não sou tol@. Esses sim, são enganados com papas e bolos.

2 de mar. de 2006

A Mata a mexer

Um responsável norte-americano da associação ambientalista WWF está, actualmente, em Portugal para conhecer e reproduzir nos Estados Unidos um projecto urbanístico português inédito a nível mundial. Este projecto é, nem mais nem menos, do que o mega-empreendimento turístico que os nossos responsáveis querem construir na Mata de Sesimbra. Este senhor, que se chama Greg Searle, quer exportar para os Estados Unidos e Canadá, aquilo que está previsto para Sesimbra que é anunciado como um ‘projecto pioneiro’ e único na Europa.
O que o senhor Greg Searle, provavelmente, não sabe é que o projecto da Mata de Sesimbra não é, de forma alguma, consensual. Que, logo na origem, está ferido de ilegalidade pois baseia-se num acordo que só fazia sentido na cabeça de um ex-ministro e actual presidente da Câmara de Oeiras, Isaltino Morais, que tem contas de um sobrinho na Suiça e a quem o Ministério Público acusou de corrupção passiva, branqueamento de capitais, abuso de poder e fraude fiscal. Claro que o acordo teve outros signatários, nomeadamente, o ex-presidente da autarquia de Sesimbra, Amadeu Penim, que, segundo se justificou bastas vezes, apenas o assinou após a sua aprovação, por unanimidade, na Câmara Municipal e Assembleia Municipal de Sesimbra. Curiosamente, os seus colegas socialistas acusaram, no parlamento, o Governo (na altura de maioria laranja) de ter «cedido em toda a linha às pretensões dos promotores alemães» ao aceitar a construção «de diversos empreendimentos turísticos de grandes dimensões» na Mata de Sesimbra, que consideraram representar «uma verdadeira sentença de morte» do local. Os parlamentares referiam-se, claro está, à actuação do ministro Isaltino, mas ele não assinou o acordo sozinho...
Independentemente dos contornos pouco claros deste acordo, e à revelia daquilo que ele determina, o que é certo é que o índice de construção previsto para a Mata de Sesimbra excede o que está determinado no Plano Director Municipal. Esta é apenas uma das ilegalidades sobre a ilegalidade original.
O que o senhor Greg Searle talvez não saiba é que a população ainda não se pronunciou sobre os planos de pormenor deste projecto.
Mas há uma coisa que o senhor Greg Searle sabe. Diz ele em declarações à agência Lusa: «Não é impossível imaginar um futuro com muitas vilas como a Mata de Sesimbra». O que ele, de facto, não sabe, é que a Mata de Sesimbra não é uma vila, mas sim uma área integrada no pequeno concelho de Sesimbra. Mas a forma como o projecto está pensado integra, de facto, a construção de uma cidade (não pequena vila) dentro de outra vila. Estamos a falar, segundo esclarece a notícia, de «50% da área total do município». Um atentado, melhor dizendo…
Mas o que todos já sabemos, porque assim nos venderam, é que a Mata de Sesimbra, quando interessou, foi vendida como pulmão verde da Área Metropolitana de Lisboa. Hoje, é antes uma zona ferida pelas pedreiras e areeiros, cujas árvores estão contaminadas com o nemátodo do pinheiro.
Mas, o que também fizeram questão de nos mostrar foi um plano de acessibilidades que prevê um ainda maior congestionamento dos acessos à sede de concelho. Ou seja, o que já está mal, pode realmente ficar muito pior.
O empreendimento da Mata de Sesimbra não tem lógica. Não resolve o problema de acessibilidades ao concelho, bem pelo contrário. E subsistem sérias dúvidas de que sirva para consolidar a área ambientalmente. O projecto não serve Sesimbra. Não está virado para Sesimbra nem para a sua população. É uma ideia megalómana que não cabe aqui, não tem espaço aqui, e não existe contrapartida que valha a pena. Sesimbra não precisa de mais e mais ‘Mares da Califórnia’, que nos façam corar de vergonha.
O senhor Greg Searle, bem que pode levar o projecto com ele para bem longe daqui.